De te ver de longe, me incomodo. Não sei mais escrever na ordem direta. Entendo que a palavra perna no plural sempre denota sensualidade, entretanto são as pernas que sustentam o tronco, acima dos pés.
Estão bambas as minhas de ver que você ainda existe e aparece inconsciente. Penso que queria que você pensasse em mim, mas é inconsistente, a vontade. Não. É densa-densa-tão-difícil-de-quebrar-quanto-uma-gelatina. Nem derreto. Chapo troço na cabeça pra não lembrar. Pronto. As pernas que durmam.
Eu fiquei máquina.
quarta-feira, dezembro 04, 2013
sábado, novembro 09, 2013
Tentativa
Sentir não é bonitinho, nem delicado. O cara que saiu no
jornal porque matou a ex mulher à facadas e deixou a faca cravada no pescoço
dela não foi frio. Fosse ele frio, não tinha matado, mas sorrido e dito que ia
ficar tudo bem. Fosse frio ele se auto-engolia e não matava. O cara se entregou
pra polícia antes de dar tempo de ser procurado. O cara confessou o crime.
Se o cara fosse frio, tinha arrumado um revólver e dado um
tiro só, ou tinha enfiado no mesmo pescoço uma seringa com ar que faz menos
sujeira e é tão eficaz quanto faca em matéria de morte. Frio fosse, estudava
exatamente um jeito de sair impune.
O cara podia ser eu, ou você, sabendo menos ainda lidar com
dor, e com não, e com rejeição de uma moça que ele ama, ou amou.
Eu não escolhi rir e dizer que estava tudo bem, mas chorar e
mandar tomar no cu. Eu podia ter arrumado uma faca e posto um fim e ido pra
polícia me entregar. Qual dor que vale? Não sei.
O delegado disse que eu não tenho que ter dó de bandido. A
gente acaba aprendendo que bandido é outra coisa que não gente. Qual a linha?
Eu não mato nada, só barata. Nem você dentro de mim eu mato,
que não tenho faca, nem seringa, nem revólver, nem força pra confessar crime.
terça-feira, outubro 08, 2013
Terezinha de Jesus: sacudiram três cavalheiros
Ai coração, hoje não. Eu vi _ eu vi _ que cada canto tem um
nome, que cada esquina uma lembrança, que cada acorde um sopro. Sem acordo,
coração. Hoje não.
Sem paradeiro, sem para-raio, sem compromisso, sem dança,
sem ele também. Entendi, cada esquina um suspiro, cada moço novo um risco, no
olho dele um estribilho e eu aqui depenada.
De nada, coração. Outro moço nunca vem, mas aparece. Tem aquele
que enrola, e aquele que nunca quer, mas quer, coração. Eu que não quero coração.
Só vocativo, coração, me deixe.
Eu vi que na árvore da praça e no banco ele ainda habita, e
eu sobressalto sem tempero pra carne, suada, sem nada, e que o outro balança,
anda reto, nem olha, e que o que diz que não quer fica ali ajuda corre abraça
pega na mão.
Eu não sei, coração. Eu nem quero coração.
terça-feira, setembro 24, 2013
Nem todo texto precisa de um nome
Joana exige demais, mas hoje não. Sou neurótica, sim, e não nego.
Tenho um ódio tremendo de talvez. Eu quero um sim gigante. Pode vir também um não,
com gelo, por favor.
Não me mate nessa tentativa de chove não molha. Não me mate nessa
tensão que eu não agüento. Volátil, volúvel, idiota, neurótica. Sou. Sou. Sou. Todo
o tempo e sem olhar relógio também.
Eu só engulo as coisas, meu bem. Não agüento a sua doença, e
sabia, mas tentei até te mostrar a minha e você nem tentar.
Neurótica, você disse.
Neurótica sim, muito prazer, frágil também, e burra como não
pareço.
Aqui é tudo ou nada, sem meio termo. Só sei ser inteira, então
vá, que metade não dou não.
Joana exige demais, e eu sempre soube que Joana era eu.
domingo, setembro 22, 2013
poema à mão armada
A violência não me assusta mais, como assustava. A solidão,
em si, também não. Sempre foi uma amiga.
O que me assusta são esses medos novos que eu nem conhecia. Medo
de cair, gente, medo de subir, gente. Medo de ser eletrocutada mesmo com
borracha no pé. Medo de poema.
A violência da subtração abrupta não me assusta, mas o
desespero do assaltante me comove. O moço magro e gritalhão não parecia
acostumado a pegar nada de ninguém, parecia precisar daquele telefone mais do
que eu.
Entreguei, quase sem medo, mas atônita, e fui pra longe da solidão. O roubo me assaltou menos que o poema mandado mais cedo. O poema recebido me botava muda, e eu caí de mim no chão, estatelada.
Não sou musa de nada, nem forte, nem bonita assim que nem
poema. O assaltante me levou o celular, o poeta me levou o chão.
Entreguei, quase sem medo, mas atônita, e fui pra longe da solidão. O roubo me assaltou menos que o poema mandado mais cedo. O poema recebido me botava muda, e eu caí de mim no chão, estatelada.
terça-feira, setembro 17, 2013
Novo eu não sei, ainda
Porque eu estou cansada como se o tempo inteiro, e o corpo
inteiro, fosse percussão. Apanho, nêgo, e cansaço é mais caro do que o dia de
amanhã. Se me tocasse hoje, mole, se me deixasse o amanhã quieto, e se viesse
como valsa, delicado, nem sei.
A bagunça é inevitável. Mesmo arrumada, alinhada, maquiada,
e tal, me cai no peito o café. Não existe freio agora que é morro abaixo. Mais um
batuque de manhã, outro de tarde. Caixas.
Se você fosse leite eu bebia pra ter cálcio, mas ele sempre
volta e eu não tenho área de escape além da pele densa. Ele não dá mais
ressaca. Desce garganta abaixo e pronto: um alento.
Não quero mais ir embora porque volta e meia tem mão pra
segurar. Estou cansada como se fosse sozinha, e cada dia menos solidão. Há
braços.
domingo, setembro 15, 2013
Encontro
Ele riu e eu comecei a querer que ele risse o tempo inteiro, porque ele fica ainda mais bonito quando ri.
Treinei o olhar pro chiste, e fui rápida nas gracinhas, nos sarcasmos, nas ironias. Ele também deve ter achado graça de me ver rindo. Caprichou na cena, se jogou na parede, impostou a voz.
Aí, de tanto riso, foi bonito à beça.
Treinei o olhar pro chiste, e fui rápida nas gracinhas, nos sarcasmos, nas ironias. Ele também deve ter achado graça de me ver rindo. Caprichou na cena, se jogou na parede, impostou a voz.
Aí, de tanto riso, foi bonito à beça.
sábado, setembro 14, 2013
um trauma é só uma marca, ora
Disperso que ele é, de quando em quando me assalta o tempo
inteiro. De medo, não vou inteira. Da falta presente, do corpo, do logo ali, do
nada. Não sei agir, e ele também não sabe.
Tenho ânsias. Tenho medo de me rasgar de novo. Invento
desculpas, compreendo mais do que posso. Apresento-me bandeja. Apresento-me
faltosa.
Não vou. Ele também não vem.
Invento o fim da história que nem começou.
domingo, agosto 18, 2013
verde
Eu tinha uns nove anos, e era muito amiga da Mariana. A gente tinha várias coisas em comum: as chiquititas, a tv cruj, Sandy, Júnior, o ódio à matemática e à cor verde. Matemática eu não podia dizer que gostava e sabia, porque isso seria motivo grave de rechaçamento. Mas era bem fácil não gostar de verde, porque verde sempre foi cor de menino.
Então a gente não usava roupa verde, nem escolhia os pinos verdes dos jogos, nem era nunca do time verde. Estava posto que menino gosta de verde, e a gente simplesmente não podia gostar das coisas que os meninos gostavam.
Isso posto, gostávamos de rosa e amarelo. Eu preferia sempre os pinos amarelos, os lápis de cor amarelos e as camisas amarelas, que sempre me caíram muito bem.
Mas aí deu que eu cresci, e mesmo tendo mantido a rejeição ao verde, fui percebendo que me preferi sempre perto de árvores, e que elas precisavam, sim, ser verdes. Também, com a passagem do tempo, vinham vindo presentes e o verde me sendo imposto em roupas: era bastante visível que verde cai muitíssimo bem em mim.
A noção melhor das cores, também veio, e a coisa do azul e amarelo, do cazuza, que eu amei desde a primeira vez que ouvi, com quinze anos. E o disco de cores que azul com amarelo dá verde. Daí cresceu o gosto por poesia, e veio o Garcia Lorca, e a Ufes.
As coisas que eu ia gostando, inclusive de comer, eram sempre verdes. E a vida foi me tirando aquela ideia de coisa pra menino, coisa pra menina, métrica certa e coisa e tal.
O restinho da rejeição ao verde me caiu quando a costureira tinha um pano verde de bolinhas brancas e um rabisco de modelo de vestido, no qual mexi botando a gola maior, a saia mais rodada e a manga diferente. Modelo meu, exclusivo e verde.
Minha roupa preferida, desde então. E toda vez que eu saía com aquele vestido verde arrancava elogios de modelo, de cor, de como verde realça meu próprio tom de pele.
Esses dias, falei com minha irmã que se fosse pra escolher uma cor seria laranja, amarelo ou verde. Ela, tirana:
_ VERDE NÃO.
Fiquei com aquilo na cabeça e procurei ser ainda mais verde, cada vez mais verde, até a gripe vir e a pele ganhar cor de azeitona. Depois saí com o vestido verde de bolinha branca pra encontrar um moço bonito e ele lá, de verde. De antemão eu já sabia que ia ser bom. E foi.
Depois eu fui procurar lugar pra morar, e na hora em que eu vi que a chave da porta tinha um detalhe verde e a janela uma vista verde, entendi que é isso mesmo:
O campo está aberto. É tudo verde daqui pra frente.
Desde então, nunca mais um riso amarelo.
Então a gente não usava roupa verde, nem escolhia os pinos verdes dos jogos, nem era nunca do time verde. Estava posto que menino gosta de verde, e a gente simplesmente não podia gostar das coisas que os meninos gostavam.
Isso posto, gostávamos de rosa e amarelo. Eu preferia sempre os pinos amarelos, os lápis de cor amarelos e as camisas amarelas, que sempre me caíram muito bem.
Mas aí deu que eu cresci, e mesmo tendo mantido a rejeição ao verde, fui percebendo que me preferi sempre perto de árvores, e que elas precisavam, sim, ser verdes. Também, com a passagem do tempo, vinham vindo presentes e o verde me sendo imposto em roupas: era bastante visível que verde cai muitíssimo bem em mim.
A noção melhor das cores, também veio, e a coisa do azul e amarelo, do cazuza, que eu amei desde a primeira vez que ouvi, com quinze anos. E o disco de cores que azul com amarelo dá verde. Daí cresceu o gosto por poesia, e veio o Garcia Lorca, e a Ufes.
As coisas que eu ia gostando, inclusive de comer, eram sempre verdes. E a vida foi me tirando aquela ideia de coisa pra menino, coisa pra menina, métrica certa e coisa e tal.
O restinho da rejeição ao verde me caiu quando a costureira tinha um pano verde de bolinhas brancas e um rabisco de modelo de vestido, no qual mexi botando a gola maior, a saia mais rodada e a manga diferente. Modelo meu, exclusivo e verde.
Minha roupa preferida, desde então. E toda vez que eu saía com aquele vestido verde arrancava elogios de modelo, de cor, de como verde realça meu próprio tom de pele.
Esses dias, falei com minha irmã que se fosse pra escolher uma cor seria laranja, amarelo ou verde. Ela, tirana:
_ VERDE NÃO.
Fiquei com aquilo na cabeça e procurei ser ainda mais verde, cada vez mais verde, até a gripe vir e a pele ganhar cor de azeitona. Depois saí com o vestido verde de bolinha branca pra encontrar um moço bonito e ele lá, de verde. De antemão eu já sabia que ia ser bom. E foi.
Depois eu fui procurar lugar pra morar, e na hora em que eu vi que a chave da porta tinha um detalhe verde e a janela uma vista verde, entendi que é isso mesmo:
O campo está aberto. É tudo verde daqui pra frente.
Desde então, nunca mais um riso amarelo.
segunda-feira, agosto 12, 2013
dançando sem usar as pernas
Foi a Andréa quem me ensinou o que é ter um amigo, também
foi ela quem disse certinho, sem dizer, como é perder amigo. Nunca mais quis
depois dela perder nada, nem a Flora, mas a Flora foi sem que eu pudesse
impedir.
A pior coisa de todas foi vê-la reduzida à um rótulo quando
por telefone me disseram que era só cadeira de rodas, e tinha ido. Eu nem sei o
que pensei na hora, mas chorei mais do que antes já tinha chorado um dia. E
nunca mais quis rótulo, nem perder amigo.
As lembranças mais fortes são a caixa de sapatos cheia de
roupa de boneca que a gente vendia, e ela dizendo que se eu quisesse logo o
livro de volta ela lia mais rápido e devolvia no prazo.
Não ligo pra prazo não, só pra acesso. Andréa nunca pediu
nada, mas a gente fazia. Minha tia, muito esperta, frisava que ela não era lá
muito flor que se cheirasse, e eu sabia que não era, e era essa a melhor parte.
Andréa tocava o terror na escola inteira, baixava o
capeteiro, abraçava o capeta e ensinava-o como dançar sem pés. E também me
ensinava que o mais importante é conversar.
Sei lá quantos anos ela tinha, quinze? Sei lá quantos anos
eu tinha. Nada. E também eu era difícil e tocava o capeteiro e continuo sendo
pirracenta e chata, mas ainda gosto de conversar e de ler, como ela.
O aniversário ainda lembro a data, mas a rifa não lembro
quem ganhou, nem como entregamos o dinheiro. Ela era tão forte que achava o
máximo quando tinha que tomar sangue uma vez por trimestre porque aí ficava
ativíssima.
Ainda assim, era amarela, e tinha aquele cheiro que eu
aprendi a reconhecer depois como cheiro de prazo curto. Tenho medo de sentir
aquele cheiro em mim, mas depois dela já senti outras duas vezes e não disse.
Também não aprendi a costurar como ela, e não vou sê-la
nunca. Mas preciso volta e meia lembrar dela e sentir falta, porque aí entendo
que sirvo pra contar história, e que isso é útil para moças amarelas que gostam
de costura e têm prazo curto. Que narrativa aumenta a vida já contada, e que dá
pés.
sexta-feira, agosto 02, 2013
Alvará
Chega com sirene acesa e gritando ao olhar fundo e imponente
e ser maior. Grande bosta. Disse que aqui não passava, e não passa.
Insistiu que direito de ir e vir existe. Comigo não.
Em mim, senhor, quem decide sou eu. E não importa em qual
categoria de poder você se enquadra: polícia, cachorro, bandido, duque,
marechal.
Digo não.
Dê ré.
Sem essa cara de pateta, por favor, que não é tão incrível
entender que exista não.
quarta-feira, julho 31, 2013
Nojento e babão
Tinha um velho nojento, babão e beiçudo no café. Decrépito,
ridículo, feio de doer. Não sei a idade, mas devem ser uns cento e vinte anos. E gente assim devia ficar dentro de casa, porque gente nojenta deve ter seu
direito de ir e vir cerceado. Inclusive questiono se velhos nojentos deveriam
ter direito à liberdade de expressão. Na minha concepção, não.
Na minha concepção gente escrota tem mais é que morrer pra
deixar de ser ridícula e de enfeiar as ruas. Nas minhas ruas, só gente jovem e
bonita. Isso se essa rua fosse minha, mas não é.
E provavelmente todas as coisas que eu disse acima são
assustadoras e desagradáveis de se ler, porque afinal de contas eu não posso me
referir a um idoso chamando-o de velho, e muito menos de feio, babão e nojento.
Isso acontece porque existe o entendimento de que o envelhecimento e a conseqüente
perda da beleza e do viço são coisas naturais, que não podem ser impedidas e,
portanto, não podem ser julgadas da forma como eu fiz acima.
Pois bem, entendemos que o conceito de velhice pressupõe
respeito. Sempre nos disseram que devemos respeitar os mais velhos e tratá-los
com dignidade. Fazemos isso, portanto, e tentamos entender suas limitações e
ajudá-los no que for possível.
Mas tinha um velho nojento, babão e beiçudo no café. Repito sem
me desculpar, porque ele dizia que Deus fez o homem e Satanás fez viado e sapatão.
Depois ele disse, como se fosse a coisa mais natural do mundo, que tem nojo
quando vê dois homens namorando.
Qual não foi minha surpresa ao reparar que, em todo o café,
a única pessoa a estranhar essa colocação fui eu mesma. Da mesma forma que é
natural não dizer que um velho babão é um velho babão, porque isso é
desrespeito, é natural dizer que homossexuais são nojentos.
A referência me parece difícil de alcançar, primeiro porque
eu sou jovem, mal completos vinte e cinco anos e muito pouco conhecimento
acerca de preconceitos com a sexualidade alheia. Nunca me ensinaram que um
homem que beija outro homem é nojento. De forma que não aprendi a pensar assim.
Por outro lado, sempre me disseram que todos merecemos respeito e que ninguém
merece ser julgado, e que todos temos direito à defesa.
Fiz-me, portanto, advogada de meus amigos homossexuais, que
por não estarem ali, ou não se anunciarem ali naquele momento, não poderiam
defender-se das acusações de serem nojentos ou filhos de Satanás.
Expliquei, exaltada, que partindo do pressuposto de que
exista um deus_ que eu não sei se existe_, este criou todos os seres humanos.
Mas Deus criou macho e fêmea, retrucou o velho. Sim, genitália
feminina e genitália masculina, mas ninguém é melhor ou pior por ser gay. Ser gay
não é ser ruim. Ser ruim é ser mau-caráter, tentei ser simples na argumentação.
O senhor velho babão, entretanto, não acredita que, da mesma
forma que ele não escolheu ser velho, os viados e as sapatões, como ele disse,
também não escolheram sentir atração por pessoas do mesmo sexo.
Eu talvez não devesse tentar discutir, mas ele insistia em Satanás,
e eu disse que esse tipo de pensamento é ridículo. Ele disse que ridículo é ser
gay. O moço do balcão serviu meu café e disse para que eu deixasse para lá. Eu expliquei
que é ridículo disseminar esse tipo de fala porque é isso que faz com que
depois um homossexual apanhe na rua e isso seja natural.
O velho disse que ele não disse isso. Eu expliquei que se
fica socialmente aceito que Satanás fez os gays, e que todo o pecado deve ser
eliminado, isso motiva a violência contra essas pessoas. O velho insistiu que
eu botava palavras na boca dele.
Eu disse que não estava botando palavra nenhuma, só
explicando as conseqüências do que ele mesmo diz. Aí ele gritou que viado é
tudo nojento. Eu gritei de volta que nojento é gente preconceituosa.
É lógico que eu estou equivocada por entrar nesse tipo de
discussão com um senhor que, ao que parece, não vai mudar de opinião. É lógico,
também, que eu não tenho argumentos bons o suficiente para competir com um
preconceito que eu mesma não conheço, nem sinto na pele. Entretanto, não
consegui evitar a revolta, nem a discussão. Por fim, me sobra contar o que
houve pra ver se mais gente se assombra junto e deixa de ensinar que o inevitável
é nojento.
quinta-feira, julho 18, 2013
cáustica
É que estou toda entupida. Só posso escrever.
Eu até vi primeiro, mas ela viu melhor. Daí ganhou. Não sei.
Fica assim combinado: te ofereço juventude, viço, energia e
chatice. Você me oferece conselhos, olhar reprovativo e compreensão. Eu não
preciso te entender, nem você a mim, mas a gente se ajuda e vai. Eu como o
mundo, você avisa pros outros que isso é necessário.
Meu útero resolveu que tem vida própria, e doeu pra ver se o
sangue desce, contrai que é uma beleza. As vias respiratórias também, e os
poros.
Meu deus, o que que falta desentupir além de mim mesma antes
do resto? Se durmo não dá. A Amanda é mais bonita porque tem olho azul.
Bonita eu não sei pra que serve, mas o planeta Vênus faz um
arco com Mercúrio, daí brilha e eu preciso vazar.
O moço não liga pras besteiras que eu falo. Diz ele que não
pode, nem gosta de julgar. Nem sei se ele escuta. Meus olhos são estrábicos e
sempre serão.
O bom é que eu sempre vejo mais do que uma flor, e sempre
entorto.
sexta-feira, julho 05, 2013
Tem gente na Assembleia Legislativa do Espírito Santo
“A flor e a náusea
Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
É feia. Mas é flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.”
Carlos Drummond de Andrade
A polícia chegou a dizer que não poderiam levar comida para
os manifestantes, mas um deputado enfrentou o coronel e disse, fica você sem
comida, então. Na rua a polícia desceu o cacete, mas os moços de dentro e fora
da casa de leis permaneceram. Permanecem.
Do alto de nossas cadeiras e computadores ligados na câmera
ao vivo, apoiamos a permanência, a força, a resistência. Por algum motivo, não
nos sentimos capazes de tomar posse de uma casa nossa que nunca nos pareceu
lar. Mas assistimos e torcemos. Agora parece lar. Um homem levou nutella para os
manifestantes.
Um homem levou nutella e mais de duas mil pessoas viram o
pote sendo dividido ao vivo, no live stream. Um homem que leva nutella
manifesta-se tanto quanto quem acampa, ou mais. O que ele diz não é apenas
tenho esse pote aqui e acho que vocês precisam de comida.
O que ele diz é: vocês que resistem por mim, merecem comer e
receber o que há de melhor. A alegria dos meninos com frio, acampados por uma
ideia, os meninos que nem precisam tanto desse dinheiro do pedágio, mas que
entendem que todos precisamos de investimentos em outras áreas e que pessoas são
mais importantes do que um pedágio.
Os meninos, os moços, as meninas, com nome de comida, com
apelido, com frio, com uma força que, meu deus, eu não tenho. Eu de covarde não
acampo, não durmo fora de casa, não quero que me vejam feia e fico aqui
prezando pela privacidade do meu próprio bafo matinal, das minhas remelas.
Eu que sou tão egoísta, tão pequena, não posso deixar de
derreter porque nasceu, em mim, que sou de asfalto, uma flor. Um homem levou
nutella para aqueles que têm a coragem que eu não tenho, uma coragem
absurdamente necessária.
quarta-feira, julho 03, 2013
Ba-der-na
Esse siso vandaliza minha boca mais que fio dental. O cabelo
parece que memória. Entre os braços, hidratação de pele. Entre pele, memória de
vulcão. Calores de falta de vento, maquiagem bloqueando poro, peito aberto. O
corpo anda dizendo aos quatro ventos que não sou mais ontem.
_ Abriu-se, danou-se. Simples assim.
terça-feira, junho 25, 2013
Açaí
Me esconda no céu da sua boca e chupe qualquer líquido que haja.
Esfarele tudo o que seja osso, que seja denso, duro, constante.
Reinvente a moça cuspida com saliva em lugar de costela e a desconheça pra nunca mais ver.
O que sobrar, você nega, encosta num canto, esfola e chuta pra rolar no morro e te tirar de dentro forever.
Esfarele tudo o que seja osso, que seja denso, duro, constante.
Reinvente a moça cuspida com saliva em lugar de costela e a desconheça pra nunca mais ver.
O que sobrar, você nega, encosta num canto, esfola e chuta pra rolar no morro e te tirar de dentro forever.
quarta-feira, junho 19, 2013
Mais vinagre, mais amor, juntinho, moço.
Olha, moço. Estou desesperada com essa arruaça que virou meu facebook, meu instagram, a rua da minha casa. Não me acostumei ainda com tanta revolta não sendo só minha, com esse cheiro agudo de vômito coletivo.
Olha, moço, a gente quer que o mundo seja mais bonito, mais florido, todo mundo mais educado, a gente quer conseguir ir ali sem passar raiva, a gente quer poder ficar calmo. Não quer?
Moço, me desculpe, mas eu nem posso dizer que meu cansaço do entorno é maior do que o seu, então vamos juntos dar mais uma vomitada pra ver se o cheiro cresce, a Pec desce, a cura o gay, o resto todo.
Ai, moço. Todo dia alguém me violenta quando cai meu telefone, quando de noite dá medo de atravessar a rua, quando tenho que trabalhar por pouco dinheiro. Ai, moço, tá bom não, moço. Sei lá porque você também acha tudo. Sei lá de onde veio esse grande dedo na goela da galera toda. Mocinho querido, nem te conheço, mas tenho medo de amanhã a gente não lembrar que hoje a gente faz tanta questão de mudança geral.
Olha, moço, a gente quer que o mundo seja mais bonito, mais florido, todo mundo mais educado, a gente quer conseguir ir ali sem passar raiva, a gente quer poder ficar calmo. Não quer?
Moço, me desculpe, mas eu nem posso dizer que meu cansaço do entorno é maior do que o seu, então vamos juntos dar mais uma vomitada pra ver se o cheiro cresce, a Pec desce, a cura o gay, o resto todo.
Ai, moço. Todo dia alguém me violenta quando cai meu telefone, quando de noite dá medo de atravessar a rua, quando tenho que trabalhar por pouco dinheiro. Ai, moço, tá bom não, moço. Sei lá porque você também acha tudo. Sei lá de onde veio esse grande dedo na goela da galera toda. Mocinho querido, nem te conheço, mas tenho medo de amanhã a gente não lembrar que hoje a gente faz tanta questão de mudança geral.
segunda-feira, junho 17, 2013
churrasquinho
Das coisas que eu não entendo, seus olhos ocuparam
presentemente o centro do arquivo. Divido-me em cinquenta e nada de fazerem
sentido. Queria que fosse você mais vesgo pra eu saber que não é pra mim que
olha, ou saber menos. Entretanto, há brilho. De brilho, meu bem, só sei que
derreto.
Já sou de fogo, posso muito pouco com faísca. Quando esvazia
parece que caio num fosso, num poço, num breu. Por favor, me olhe desse jeito
mesmo, de brilho, de besta, igual ao cachorro que queria que eu jogasse carne
pra ele na calçada e comia com afinco a gordura do resto de picanha fria.
A gente podia ser bicho e o resto além da carne podia ser
nada. A gente podia só se comer.
sexta-feira, junho 14, 2013
A culpa é do Marlon Brando
Um nome que eu sempre gostei foi Victor, com c mesmo. E Daniel, Danilo, Marco Antônio, Thalles. Thalles tem que ter a frescura toda, que parece que Tales não tem a mesma graça. Nenhum desses nomes gostaria que fosse de filho meu.
Filho meu é Francisco. Os outros nomes de homem são nomes que eu só gosto de saber que existem. A verdade é que eu não gosto de falar os nomes das pessoas que eu gosto, a não ser que fosse cria. Chamo de outra coisa. A Natasha eu chamo de Marcelinha, a Marceliha eu chamo de Natasha, a outra Marcela eu chamo de irmã.
Só o Heitor eu chamo de Heitor, mas é só porque ele anda meio chato. Se ele estivesse apenas fofo, sem chatice nem chantagem, se chamaria meu lindo, não Heitor. Que nem Davi, que só é Davi quando é pra se referir a ele. Quando ele é ele, é essa coisa linda, meu amor, meu doce, lindeza, pequeno ou qualquer outra coisa que não o nome.
Explico: peguei medo de nomes depois de ver O último tango em Paris.
E me perdoe se não vê motivo. Digo apenas que Marlon Brando e manteiga são motivos enormes pra filme. Depois a gente conversa.
Filho meu é Francisco. Os outros nomes de homem são nomes que eu só gosto de saber que existem. A verdade é que eu não gosto de falar os nomes das pessoas que eu gosto, a não ser que fosse cria. Chamo de outra coisa. A Natasha eu chamo de Marcelinha, a Marceliha eu chamo de Natasha, a outra Marcela eu chamo de irmã.
Só o Heitor eu chamo de Heitor, mas é só porque ele anda meio chato. Se ele estivesse apenas fofo, sem chatice nem chantagem, se chamaria meu lindo, não Heitor. Que nem Davi, que só é Davi quando é pra se referir a ele. Quando ele é ele, é essa coisa linda, meu amor, meu doce, lindeza, pequeno ou qualquer outra coisa que não o nome.
Explico: peguei medo de nomes depois de ver O último tango em Paris.
E me perdoe se não vê motivo. Digo apenas que Marlon Brando e manteiga são motivos enormes pra filme. Depois a gente conversa.
quarta-feira, maio 29, 2013
ternurinha
Meu benzinho, se você soubesse a diferença e o tamanho do carinho. Se você soubesse dos meus armários, do volume de doçura, da tendência ao cafuné e do resto, nem ligava pra falta de força no braço.
Meu benzinho, se você soubesse a graça desses diminutivos e a suavidade da ternura, se você soubesse que sou suavíssima casca grossa, permitiria a delicadeza. Meu benzinho, eu sei que não te permito a entrada, mas calme-se. Qualquer dia me envolvo e te envolvo num abraço tão doce que a gente fica sendo praticamente um danoninho.
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