quarta-feira, julho 30, 2008

Marketing pessoal II


Prometo que depois dessa eu paro.
Acontece que são tantos links e fotos e tudo tão bonitinho que eu tenho mesmo que mostrar pra vocês.

Eu, na verdade, nem tenho muito o que dizer. Tinha uma frase pra copiar do Mário de Andrade e misturar com um poema da Viviane Mosé. É por que a Viviane fala que queria escrever pessoas inteiras, mas não hão. E o Mário fala que não existe uma pessoa inteira nesse mundo e nada mais somos que discórdia e complicação (tudo em caixa alta). E aí eu-metida-a-escritora-contista-ou-sei-lá fiquei pensando em como se passam pessoas por papel. Eu mesma faço tudo por instinto. Vejo um ou outro na rua que eu roubo. Roubo as histórias e as mágoas e principalmente os olhos.
Queria congelar muitas coisas. Espalhar muitas coisas e escrever pessoas pela metade mesmo, todas matusquelas, estranhas e estorvos. Eu gosto mesmo de personagens que fedem e não sabem cantar.
Comecei a escrever pra contar que eu fiquei gatinha no jornal, mais até do que eu fico de azul. E olha que eu, em azul com brinco grande, sou um arraso.
Estavam me falando de uma cronista lá que escrevia e que não gostam. Por acidente, li um texto dela hoje que gostei. Uma amiga até passou-a para o papel em versos apaixonadíssimos.
Eu não me atrevo. As pessoas que eu passo para o papel apaixonam. É como se eu virasse canibal e comesse uma ou outra pessoa - sem os ossos. E os ossos eu empresto ou invento.
Não sei bem o que escrever, mas gostei mesmo do que escreveram.

Olha que bonitinho!

Blog da Darshany
gazetaonline1, gazetaonline2,

terça-feira, julho 29, 2008

Idílio

à Simone Azevedo

Tinha uns olhos misteriosíssimos que ela tentava adivinhar o que diziam. Não sabia. Os olhos nunca tinham sido a janela da alma e ela devia não pensar em mergulhar neles. Tinha que se concentrar na pauta e voltar a ser jornalista.
- À respeito da teoria Gramsciana dos partidos políticos atuais...
- O que?
- Desculpe. Me perdi.
- Certo. Entendo. É novata?
- Não exatamente. Queria falar de ética.
João era forte, grande e professor do departamento de psicologia daquela Universidade. Pâmela tinha que falar de ética na matéria. Ela nem se lembrava mais do mote. Nem lembrava por que tinha que falar de ética.
- E por que eu?
- É uma pesquisa, João. Diferentes visões à respeito do mesmo tema.
- Entendo.
- Então eu queria saber até que ponto a ética profissional vale mais que a ética pessoal.
- Ética é um conceito de maioria.
- Como?
- É convenção. Vale pra grupos. Nunca é universal.
- E jornalistas?
- O que quer saber?
- A relação jornalista-fonte deve ser regida por qual ética?
- Em que ponto?
- Do envolvimento. A psicanálise não fala de transferência?
- Não é a mesma relação. Um jornalista pode perfeitamente se envolver com uma fonte, sem que isso se transfira para o objeto final.
- Tem certeza?
- A imparcialidade?
- Não há nunca. Teria que me esquecer de toda a carga que tenho e que me enriquece. Imparcialidade nunca foi pretenção de ninguém. Envolver-me com alguma fonte feriria minha ética profissional?
- Na verdade, não sei se é mais importante a profissional ou a pessoal. Feriria a ética pessoal?
- Ética não era um conceito de maioria?
- O que você pensa disso?
- O que você pensa disso?
- Pâmela, talvez, como pesquisador, eu queira conhecer à fundo todos os tipos de éticas pessoais de todas as pessoas. Seria um modo de melhor encarar a subjetividade do ser humano.
- E a transferência?
- Não sou Freudiano.

segunda-feira, julho 28, 2008

Marketing pessoal

Olá, queridos.

Dei duas entrevistas essa semana por culpa do blog.
Ou seja, estou me achando.
Uma é esta aqui.
A outra, sai no Caderno 2, de A Gazeta, quarta-feira, com foto e tudo.

That'a all...

Kisses

sábado, julho 26, 2008

Diálogo de surdos (não amistoso, no frio)

- Não, querido. Pode parar logo. Você não tem o menor talento em ser otimista.

- É verdade.

- Não me importa. Seu elogios despretensiosos demais têm uma pretensão que eu mesma não agüento.

- Você soa falsa quando fala.

- É a mania de dizer que é tudo verdade. A minha obviedade tem culpa também.

- Não te acho óbvia.

- Não elogiaria se não achasse.

- Por que?

- Se eu te intrigasse você ficaria quieto e nem saberia o que fazer. É um pessimista.

- Eu só disse que vai ser melhor depois.

- Não vai.

- O que você quer?

- Não sei.

- Incisiva demais... pra nada.

- Pra tudo.

- Pode parar. Você não tem o menor talento em ser arrogante.

- Como? É só o que sei.

- E meu otimismo?

- Você deixou que eu o engolisse como faço com sapatos, mancadas e sapos.

- Às vezes você me dá medo.

- É tudo simbólico. Em pouco tempo me torno uma xícara. O conteúdo você já bebeu. Aí deixa em cima da mesa pra encher de novo quando quiser.

- Por que xícara?

- Pra ser branca e de porcelana.

- Há recipientes melhores.

- Copos de requeijão são transparentes demais. De resto, não sou eu. A caneca de lata é outra pessoa, como os copos de plásticos. Eu hei de ser pra sempre a xícara que você deixou suja em cima da mesa.

- Não te deixei.

- Seu otimismo não convence mais.

quinta-feira, julho 24, 2008

Lia

Lia acreditava quando diziam que a falta é estruturante. Ao mesmo tempo tinha muito medo disso.
Tinha que saber onde ele estava e o que fazia a cada instante. Fuçava as fotos e os fatos antigos pra ver um buraco. Procurava se encher pra não dar falta.
E a saudade doía.
Ardia feito cachaça que ela tinha que tomar.
Se embriagava.

sábado, julho 19, 2008

Encontro I

Texto novo com personagens velhas.
À Simone Azevedo
Mariana é atemporal, Giordano não. Giordano só funciona em tempos de copa do mundo, e na década de 90. Sua história se passa em junho de 1994, entre prazos e atrasos e sempre narrativa. Giordano era incapaz de escrever versos, embora Alice dissesse que ele (sempre caso de pouco tempo) era muito mais verso do que prosa. Alice gostava exatamente da intensidade sem final que Giordano insistia em ter.
Mariana nem sabia que ele existia. Ela – Lolita sem idade e dotada de vários atributos e histórias todas rodrigueanas- encontrou com ele por esses dias. Mariana funciona quando quer, sem tempo e sem me avisar que vai aparecer. Giordano trava.
Os dois juntos – óbvio – não dariam certo. Ela tinha toda a impetuosidade de quem não sabe dizer não e ele tinha medo.
Mariana queria ler o livro que ele tinha deixado pela metade por medo de resolver os próprios problemas. E Mariana se interessou por ele mesmo sem coerência e coesão nenhuma. Ela queria descobrir o que ele guardava atrás da barba mal feita e dos cabelos mal-aparados. Pensou até que ele pudesse ser, noutro corpo, o óbvio. Mas não, Giordano era diferente e cansado. Não tinha os medos do óbvio, mas coisas novas com as quais Mariana não sabia lidar e nem queria. No fim das contas, ela o achava babaca por saber que ele não resolvia nada do que devia.
E Giordano não sabia lidar com Mariana, era confusa demais, idiota demais, sonhadora demais e romântica demais mesmo fingindo não ser.
Os dois tomariam apenas um café e seguiriam seus caminhos, sem os medos dela e os dele, que juntos fariam os dois entrarem em colapso. Com ela ele não conseguiria usar os elogios falsos de sempre pra conseguir o que quisesse. Ela sabia o que era e só faria o que desse na telha. No fim das contas, Mariana gosta mesmo é de pular de galho em galho.
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sexta-feira, julho 18, 2008

Vermelho

Post meu, mas que deveria ter sido feito pela Bellon

Eu não quero saber de você, nem do seu cheiro nem dos seus versos.
No fim das contas, tudo que antes era Vinícius agora é Neruda.
E eu continuo um chameur volante pela pista à toda que enfia a carapuça e canta
Do soneto de fidelidade ao soneto de separação.

Foi o lobo quem disse que ele tinha nome de poeta e que isso já era metade do caminho. E o lobo não é mau e nunca me mandou seguir o caminho errado. O lobo me manda ler livros bons que muitas vezes eu não leio e disse-se sem qualidades. "Chapeuzinho, o livro parece comigo, você tem que ler". O lobo sempre foi um cara bacana.
Semana passada, o lobo mandou a Vovó avisar que me queria num churrasco fechadíssimo que só os outros bichos iam (inclusive uns porquinhos cuja casa meu amigo freqüenta e me disse que são muito bem feitas).
Nem soube de mais nada no fim. Encontrei com a Cinderela no caminho e ela me ajudou a vender os doces que mamãe pediu. Estamos precisando de dinheiro e eu não posso ficar parada. Mamãe cozinha e eu sigo os caminos de floresta e estrada.
Vovó não compra os doces, mas mamãe não sabe. Mamãe acha que Vovó é cliente assídua. Sim, eu sempre levo os doces pra Vovó.
É uma pena que tenha tempo que eu não vejo o lobo. Espero que ele entenda que esse tempo vendendo doces vai servir pra muito. Quero ter loja, atender encomendas mil e cozinhar muito.
Na verdade, quero mandar em todo mundo e encontrar muitos poetas sentados com charutos acesos e quindins nas mesas. Eu gosto de olhar as casacas e os bigodes espessos sujos de café.
Já avisei pra mamãe que não vou servir quindim pra sempre.
O lobo me disse "Chapeuzinho, você vai longe."
E eu gosto de acreditar nele, mesmo sabendo que o longe pode ser bem perto daqui.


E lembrar do lobo faz esquecer todos os cassadores do mundo. Eu mesma não queria admitir, mas são todos poetas. Não quero mais encontrar eu-lírico de ninguém, se não eu suspiro no contrafluxo e me torno a mulher mais discreta do mundo.

Espera

Olhou no espelho e pensou que, talvez por culpa das sobrancelhas sem fazer há mais de mês, não tinha mais a cara bonita de sempre. Queria retocar a raiz dos cabelos, que já deixavam transparecer os cachos que ela havia escondido com formol. Não se satisfaria.
Devia ter nascido com cabelos lisos para não precisar de chapinhas, formol nem nada. Devia não se preocupar com o cabelo ou com as ancas fartas. Queria pensar em coisas além do corpo que ela mesma não via - nem veria.
E ele continuava sentado no sofá esperando que ela estivesse pronta - e bonita com qualquer cara. Mas ela não estaria pronta sem fazer a sobrancelha, enfiar formol na cabeça e voltar a cantar.

segunda-feira, julho 14, 2008

Anna

Pegou as coisas, jogou na mala e foi embora. Uma bolsa de lado leve com caneta e papel e a mala grande que ela mal aguentava carregar.
Anna foi por que não podia ficar e nem sabia como é que as coisas continuariam naquele lugar de banheiros sujos e brigas constantes. A colega de quarto nem tinha acordado. Se bem que, pra ela, pouco importava o que quer que acontecesse com a outra.
O sono já não era companhia constante e talvez não voltasse a ser enquanto a conciência pesasse mais que a mala. Toda a melancolia ela anotava com letras trêmulas no caderno que não saia de perto dela.
Desceu na rua errada e não sabia mais como seguir, nem pra onde. Ia puxar o caderno pra anotar alguma coisa, mas sentiu um cano frio na altura da cintura.
- Passa a bolsa.
- Por favor, não, moço.
- Eu não tô brincando.

A mala ficou, o caderno foi. No fim das contas, Anna só sentou e chorou.

sexta-feira, julho 11, 2008

O peito

Ele passou a mão na barba branca e disse que a paixão acaba quando o mistério acaba. Gelei. Não podia assumir que ele estava certo por gostar de manter paixões por muito tempo. Mas a verdade é que a inconstância e os segredos e os medos acabam. É a espera e o não-saber que mantém a paixão, feito fogo de dúvida. Lembro ainda dele sorrindo e dizendo que grandes amores não. Logo pensei em ternura. No fim das contas eu concordava com toda a coisa do mistério e queria logo começar minha próxima paixão sem nunca dizer o nome verdadeiro.

Seria eu cada dia uma personagem nova com todos os cabelos que a tesoura permitisse e perucas. Iria à praia e aprenderia novas danças para impressionar de jeitos diferentes as novas e velhas pessoas. E a paixão me faria de besta, não iria quando eu chamasse e depois chegaria na hora não-marcada que eu quereria. Daria telefonemas e me diria como queria cada coisa (que eu obviamente não faria, pra manter a paixão).

E a barba dele me lembrava que eu nem devia pensar em nada daquilo. Devia manter a ternura e não ter dúvidas. Devia gostar de ternura como eu bem gostava e gostar de carinho como eu ainda gosto. Eu devia manter no peito a coisa quente que sempre vem. E me mantive quieta e muda.

Tive que repensar todos os dias uma inconstância cansativa para manter tudo constante e forte.

domingo, julho 06, 2008

Velha

O problema é que ela não sabia o que faria depois de se levantar daquela pedra e abandonar a sombra daquela árvore. Gostava do cheiro de mato e areia daquele lugar, mas tinha que prosseguir para mais goiabas e talvez até uma jornada em outro lugar.
Tinha dito que queria estar longe, ser forte e não ter mais nenhum medo. Mas estava assustada com tudo que poderia ser e inclusive com o que tinha acabado de perceber que já era.
Olhando à volta via pouco além de leite na lata e crianças sujas. Olhando pra dentro via pouco além de mágoas e vontade de não se ser.
Teria que assumir que o problema não era da árvore nem das crianças. O leite deveria ter sido tirado há pouco tempo da vaca e, se ela tivesse forças, derramaria-o e se esqueceria de tudo que não queria se lembrar enquanto ele se misturasse ao chão.
Levantou, devia pegar as goiabas antes que elas caíssem do pé.