domingo, agosto 18, 2013

verde

Eu tinha uns nove anos, e era muito amiga da Mariana. A gente tinha várias coisas em comum: as chiquititas, a tv cruj, Sandy, Júnior, o ódio à matemática e à cor verde. Matemática eu não podia dizer que gostava e sabia, porque isso seria motivo grave de rechaçamento. Mas era bem fácil não gostar de verde, porque verde sempre foi cor de menino.
Então a gente não usava roupa verde, nem escolhia os pinos verdes dos jogos, nem era nunca do time verde. Estava posto que menino gosta de verde, e a gente simplesmente não podia gostar das coisas que os meninos gostavam.
Isso posto, gostávamos de rosa e amarelo. Eu preferia sempre os pinos amarelos, os lápis de cor amarelos e as camisas amarelas, que sempre me caíram muito bem.
Mas aí deu que eu cresci, e mesmo tendo mantido a rejeição ao verde, fui percebendo que me preferi sempre perto de árvores, e que elas precisavam, sim, ser verdes. Também, com a passagem do tempo, vinham vindo presentes e o verde me sendo imposto em roupas: era bastante visível que verde cai muitíssimo bem em mim.
A noção melhor das cores, também veio, e a coisa do azul e amarelo, do cazuza, que eu amei desde a primeira vez que ouvi, com quinze anos. E o disco de cores que azul com amarelo dá verde. Daí cresceu o gosto por poesia, e veio o Garcia Lorca, e a Ufes.
As coisas que eu ia gostando, inclusive de comer, eram sempre verdes. E a vida foi me tirando aquela ideia de coisa pra menino, coisa pra menina, métrica certa e coisa e tal.
O restinho da rejeição ao verde me caiu quando a costureira tinha um pano verde de bolinhas brancas e um rabisco de modelo de vestido, no qual mexi botando a gola maior, a saia mais rodada e a manga diferente. Modelo meu, exclusivo e verde.
Minha roupa preferida, desde então. E toda vez que eu saía com aquele vestido verde arrancava elogios de modelo, de cor, de como verde realça meu próprio tom de pele.
Esses dias, falei com minha irmã que se fosse pra escolher uma cor seria laranja, amarelo ou verde. Ela, tirana:
_ VERDE NÃO.
Fiquei com aquilo na cabeça e procurei ser ainda mais verde, cada vez mais verde, até a gripe vir e a pele ganhar cor de azeitona. Depois saí com o vestido verde de bolinha branca pra encontrar um moço bonito e ele lá, de verde. De antemão eu já sabia que ia ser bom. E foi.
Depois eu fui procurar lugar pra morar, e na hora em que eu vi que a chave da porta tinha um detalhe verde e a janela uma vista verde, entendi que é isso mesmo:
O campo está aberto. É tudo verde daqui pra frente.

Desde então, nunca mais um riso amarelo.

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