domingo, agosto 31, 2008

Pírulas

Estou cansada e sem histórias.

Preciso ler um pouco e dormir muito.

Falta aquela paz que eu nunca quis.

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Ela tinha uma paixão absurda por orelhas. Não as olhava ou analisava detalhes. Gostava de sentir com a língua e os dentes o potencial erótico do que servia só para ouvir.

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Não iriam morrer de nada. Eram fortes e muito bem apanhados. Mas quando ela entrou bonita, pequena e de batom vermelho, disparou dois tiros na barriga dele, depois se matou.

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Que a gratuidade seja infinita enquanto dure, feito amor de carnaval.

sábado, agosto 23, 2008

sem título

Não gosto nunca de te ver triste. E eu fico triste com você triste por que me importo e sempre achei tudo muito sorriso. Acontece que eu preciso de tempo e besteiras. Dos contágios que se adquire com loucuras periódicas e saudáveis. Preciso mesmo não ter chão pra me entender um pouco e te entender muito.
Preciso arrumar um chão novo que suporte as minhas loucuras mesmo sabendo que não haverá cumplicidade nem carinho. Preciso estar vazia pra depois encher e transbordar.
Sinto falta do desprendimento que sustenta a minha poesia. Tenho tanto medo de tudo sério. Tanto medo.
Não se estrague e não se mate que eu não me perdoaria. Me deixe ficar quieta e muda tendo inveja das pessoas que não estão tão sozinhas. Me deixe sorrir e fingir que nada importa.
Me deixe. E não fique triste.

quarta-feira, agosto 20, 2008

Carta-crônica para Luiza

Ô Luiza, sua irmã me disse que você disse que não escreve sobre pressão. Disse a ela que você está certa, mas meu processo é diferente. A Viviane Mosé diz que precisa de vazios para escrever. “Faço poemas dos silêncios que ouço”, eu li ela dizer.

Eu não. Eu preciso estar cheia e escrevo pra esvaziar. Preciso de toda a pressão.

Se me pedem, não. Aí é outra coisa. Luiza, eu não escrevo para agradar a ninguém. Até acreditava que sim, mas quando tento a escrita fica tão ruim. Fica tão vazia.

Eu preciso de escrita cheia como preciso de mim cheia para conseguir continuar me locomovendo e fazendo alguma coisa dar certo. Eu preciso que tudo dê certo pra trabalhar e preciso que nada dê certo para escrever. Eu preciso estar cheia e não dormir para me sentir útil.

Talvez eu não seja mesmo normal. Acontece que eu preciso estar full de paixão, feito fool. Aí eu fiquei lembrando da música do que guiava tudo no princípio. Eu cantava que era such a fool for you. E agora canto que it’s time to start changing the rules. E I’m a fool de novo.

Qual é a minha, afinal de contas? Por que é que eu tenho que botar o fool no meio? Por que é que eu tenho que ser a fool, Luiza? Isso de fool não ajuda em nada a escrita. Ao contrário, inibe. Enche de um jeito que é tipo ar. Eu fool me sinto bexiga. Full.

Pois é. A pressão está toda aí, mas a bexiga é forte e não vai estourar. Me passe a sua pressão e escreva, Luiza.

terça-feira, agosto 19, 2008

Pedaços

O vermelho era exatamente o que faltava ao cabelo para o meu rosto ser o que eu queria que fosse.
Agora sou o que quis. Muito estranho pensar que projetei coisas como projeto sempre e agora todas deram certo. Tenho achado que a paixão se dá por culpa de filetes de carne. Tiras. Pedaços moídos e principalmente cheiro.
Eu me apaixono por pedaços. Tons de vozes, olhos, peles, pêlos e nádegas.
Ele tinha carnes fartas e duras, boas de apalpar, e eu gostava de cada filete da carne que eu tinha que sugar e morder.
Ele era forte e grande e eu sumia num abraço.
Ele era do meu tamanho e tinha mãos finas.
Ele era magro e garregava o peso de um dia não ter sido assim.
Ele era bonito.
São os filetes que determinam a intensidade da paixão. Se a gente morde se apega mais que se não morde. Se a gente cheira e fica cheirando é pior ainda.
Filetes de cheiro grudam e fazem falta.
Muitas vezes é melhor não sentir o cheiro pra não correr risco.
Filetes de carne.
Vermelho.
O plano era esse.

domingo, agosto 17, 2008

Liquidificador

à Jeanne Bilich (que dificilmente vai ler este texto)
Ela me disse que os conhecimentos todos vão acumular na minha cabeça. Tenho muito medo de esquecer todas as coisas como já me esqueci dos problemas de física que tanto gostava de resolver. Gosto de me meter em tudo que não diga respeito a esportes. Ela disse que, como ela, eu gosto das coisas interdisciplinares.
O que eu queria saber é por que é que o campo de saber tem que estar delimitado e sê-lo apenas por ele mesmo. Biografias, por exemplo, são história, literatura, jornalismo e até psicanálise. Tudo batido no liquidificador com tanta uniformidade que você não sabe qual é o fator principal.
Estou me sentindo muito melancólica nesse texto. Me falta a doçura ou a ironia de outras crônicas. Nem tenho onde pisar agora. Estou com vontade de engolir o mundo e o meu próprio rabo, feito serpente.
Preciso correr atrás de mim.

O intelectual

Ele era tão temperamental e fraco que confundia. Não era possível saber se gostava de alguma coisa. Ele era responsável e dedicado, mas ranzinza. Não queria ninguém por perto que não fosse uma enciclopédia ambulante.
“Afetos a gente joga no lixo. Não servem pra nada.” Dizia e depois se apaixonava por várias mulheres que não gostavam dele só pra ele ter certeza que não devia mesmo sair do rumo.
E vivia triste e sozinho.

sábado, agosto 16, 2008

Fossa

Tinha perdido totalmente a graça. Não queria ver nenhum amigo nem nada. Ninguém. Tinha que ficar sozinha e pensar e rodar e dançar sem direção e sem voz.
Queria se esquecer que só uma pessoa importava.

quinta-feira, agosto 07, 2008

Cotidianidades 001

Aí ele entrou com tudo na sala. Veio rápido. Acreditava estar voando por ter um lençol branco e azul amarrado no pescoço. Blusa vermelha. Sunga azul. Meias azuis sem nenhum tênis encostando no chão.
No alto de seus dois anos de idade ele tinha poderes e cantava "tan tan tan tan" com os bracinhos esticados para frente. Virou pra mim e disse “você é a mulher gata”. Acreditei. Ele ficou voando de um lado para o outro e eu caí na besteira de perguntar:
- Você é o Super Homem?
- Não! Sou o Batmaaaaan!!









Na foto, o Homem aranha

terça-feira, agosto 05, 2008

Da nada

Meninos, estive me pensando cronista. Mas cronista dessas que não tem absolutamente nada para escrever e escreve por que tem prazo pra entregar o texto.
Não tenho nenhuma história para contar, as minhas se esgotaram todas e ando vivendo uma rotina sadia, quieta e com picos constantes de raiva que mantem-me viva. `Preocupo-me, então, com a rotina alheia que por vezes parece muitíssimo interessante. Aí cansa. Cansa por que a história do outro a gente não vive, só ri. Nalgumas vezes a gente tem ciúmes de tanta emoção e suspiros que nós, meros mortais, não temos na rotina calma que se faz entre corridas de empregos, projetos, estudos, amores e colos.
Só que eu tenho que me forçar a escrever pra ser escritora de verdade. Esses dias alguém me falou de certa rotina. Acho tudo muito forçado. Acho que texto tem que vir da alma e com suor. Ou com vontade. A vontade é fator fundamental em qualquer texto escrito por qualquer pessoa.
Ultimamente, não tenho tido muita criatividade com palavras. Tenho mexido com cozinha.
Pra fazer angu você frita o alho, joga fubá, água e sal. De preferência, só isso, mas eu sei que você acaba pegando aquele tempeiro pronto que tem na geladeira e joga em tudo. Fica bom também. Mas o Angu sozinho não tem tanta graça.
Precisa ter carne moída em cima. E você deve fritá-la com cebola bem picada, jogar tempeiro pronto, sal, salsa, ervas finas e todas as coisas temperísticas que achar na geladeira. Depois de bem frita, joga água e deixa cozinhar. A cebola, nisso, derrete. Aí a água seca e você frita mais, depois cozinha mais.
Aí depois joga pomarola.
Por fim, uma camada de angu, uma camada de queijo e outra de angu e outra de queijo. E aí vem a carne moída.
Pronto, almoço.
Pronto, fiz crônica.