quarta-feira, janeiro 16, 2013

não sei de nada


não me deixe largada na beira da estrada sem eira nem beira sem nada, sem casco, sem lead, sem praga. ao menos um xingamento, um respiro, um norte. por favor um amanhã que eu estou cansada de todos os ontens.
você tão futuro hoje, meu deus. você é quase religião. não me deixa não. fica mais meia hora que amanhã a gente toma um chá. acho muito estranho não gostar de café, mas apesar disso ainda consigo sentir coisas.
olha, você deve ser mesmo de outro mundo que a vida sem café não sei pensar. por que raios você existe e existe calma e existe outro país? eu vou ter que ir, você não volta mesmo e a gente tem que andar ao infinito, e além.

segunda-feira, janeiro 07, 2013

Before Sunrise


Se fosse uma comédia romântica, você não atendia o telefone, mas a gente se cruzava na esquina e se beijava e você não ia embora. E se você fosse, a lembrança seria forte e bonita até o segundo volume, num outro país, outro continente, diálogos engraçados e alguns tombos.
Estaríamos sóbrios, também, e os olhos da gente seriam muito mais bonitos. E você seria o amante perfeito inatingível, e eu, complicadíssima e completamente machucada de outros amores.
Mas a gente se curaria junto inteiro e seria, por alguns momentos, felizes como se infinito houvesse. 

quinta-feira, janeiro 03, 2013

sempre?


As cicatrizes são do tamanho exato da ponta dos meus dedos. Medi enquanto ele dormia. Olhei, sim. Olhei muito sem entender porque aquele tamanho de pudor de toque quando havia nudez absoluta.
Não consegui abraçar por trinta segundos. Não entendi porque a garganta se transforma em liquidificador quando há proximidade.
Quase nada, insisto. Nada mesmo, insisto. Não vou, quase grito. As cicatrizes conferem ternura que não existe, mas incide. Explodo como se o verbo existisse. Como se nem fosse pessoa, mas força, fluido, fogo.
Cedo.

quinta-feira, dezembro 27, 2012

Correnteza


 Meu corpo parece o mar.
Vale a briga daquele homem que olha atravessado sem admitir qualquer mergulho?
Nade, homem. É um braço, depois o outro_ e os pés dando estabilidade quando se debatem.
Brigue sim a minha água. Enfrente o infinito que há, uma fauna inteira de coisas além do possível afogamento.
Olhar o fundo é um erro, meu bem.
Não é preciso viver sem prender o ar. 

segunda-feira, dezembro 24, 2012

As festas


Se é finitude coisa leve ou pesada, não sei. Mas a existência pesada dela é insustentável. Sempre quis, de qualquer forma, o infinito. Mas o infinito é um átomo, um instante, um brilho avulso de olhar.
O que eu quero de natal ou de promessa de ano novo, ainda não pensei. Mas a Argentina está logo ali e eu tenho muito bons amigos.
Continuo detestando qualquer tipo de espera, e por isso baseio a pontualidade no instante crasso.
Acaba o ano, o mundo também. Não sou exatamente a mesma coisa, e talvez por isso absolutamente vulnerável.
Que tudo brilhe e escorra, enfim, em um 2013 sem entalações.


terça-feira, dezembro 18, 2012

Sumo

Sendo a anatomia uma loucura, sinto os amores no estômago. Ao invés de disparamento cardíaco, vêm voltas e voltas, problemas de digestão. Ele, por exemplo, nem desceu na garganta e mesmo a fome que vem, de pão, não pode ser morta antes de um desentalar.

Não venha ele querer só sumo, que eu tenho a casca grossa. Há que se morder com força, de arrancar pedaço, casca, sumo, semente. E que seja a bocada tão intensa que ele sinta o gosto, goste e entale e durma até que eu chegue perto prum despertar. Aí sim, o sangue sobe, circula, festeja e fica disritimado o coração.  

domingo, dezembro 16, 2012

Che


Vou lembrar que as melhores pessoas são as loucas que explodem como fabulosos fogos de artifício e que foi nesses fogos que veio seu olhar de cachorro na frente da assadeira de frango da padaria. E foi pra mim. E foi em mim. E foi com a boca.
Dos telefonemas pela madrugada e de todos os ombros, que não foram poucos, nem pequenos. A firmeza da pele e a voz quando era firme.
Acho que foi Sófocles que eu te dei de presente quando veio aquele sorriso descrente, surpreso, da minha própria lembrança.
Vou lembrar que você não ficou bravo descobrindo que eu tinha olhado a sua carteira de identidade pra saber a data do aniversário que nunca havia sido dita para quase ninguém. Nem quando eu disse para todos os nossos amigos que era aquele, o dia.
Aquela garra, aquela força, aquele chão em que você se jogou e apanhou, aquela luta, aquele não. Você dizendo que ia embora, e não indo.
Você ali em chuva e em sol, e sempre, e tanto, que mesmo espaçado, o tempo, era tenso. As brigas, vou memorar com carinho, e remoer com ternura.
E aquele dia que você disse que eu tinha olhos bonitos e levou no bolso meu brinco como se fosse um pedaço de carne. Minha.
Deixa pra lá que também foi ruim. Você ainda deve ter o brinco e o beat, mesmo que mangue.

quinta-feira, novembro 01, 2012

Corrente. Fluxo. Água. Mar. Graça. Horizonte. Equilíbrio. A vista mais bonita da cidade.


Com ela as coisas foram rápidas. Comigo tudo tinha intervalo e obstáculo. Lapso. Taí: eu fiz tudo pra você gostar de mim.
Fiz planejamento estratégico da marca, estratagema de entregas. Investi no serviço de atendimento ao consumidor. Gerei pauta positiva na imprensa, estudei trilha sonora, cavei e estruturei três ou dois castelos. Tentei ver raça de cachorro.
Bons resultados de curto prazo, mas nada de marca fortalecida e estrutura bem fundamentada.

Queria tanto não ter tido que fazer nada.

- Minha filha, amor não tem coisa de planejamento.  

sábado, outubro 27, 2012

Quase nada


Primeiro trocar as senhas, depois esquecer as datas. A presença dele me sufocava. Estava no ar da cidade, no cheiro de qualquer pano, no travesseiro, no muro, no mundo. Pensei em ter esperança, mas não. Quis voltar a vê-lo, mas não. Preciso tirar as lembranças do alcance, botar numa caixa, destituir a presença. Preciso parar de trata-lo de você, pois é ainda autoridade que me fez curvada (cheguei até a pensar em mudar de hábitos). Mas eu não sou de tanta curvatura, sigo fora da linha, torta, reta, sigo.
A presença dele me sufocava e eu de ansiedade ficava grogue, pequena, gasta, medrosa, travada. Não. Preciso ser só o que sou: muito. 

sexta-feira, setembro 14, 2012

da chatice


Caro colega, avulso leitor, amantíssimo colecionador diário de sei lás, estou preguiçosíssima hoje. Não vou levantar da cadeira, não vou olhar pro lado, não vou fumar cigarro (não agora, só daqui a pouquinho), não vou inventar foto. Só superlativos.
A professora ensinou um monte de coisa quando dava na minha cabeça com aquele português. E eu entendi que sou superlativa e insubordinada por que as coordenadas são muito mais simples de entender. Restritiva ou explicativa, depende com quem eu falo.
Mas a Cláudia Sabadini, que tem menos preguiça que eu, disse que é sempre insubordinada e pronto. Daí a minha avó me apontou a medusa nos cabelos quando eu levantei, e eu lavei. Porque lavar existe porque existe água.
E eu estou enrolando pra dizer que detesto quando cismam de inventar desculpa pra qualquer coisa, embora este pretenso texto seja apenas uma desculpa pra dizer um tanto mais do que já digo.
Caro colega colecionador de sei lás, você não está mal porque a vida está corrida agora, nem porque o flamengo vai mal, nem porque hoje o dia está frio, nem porque ontem esteve quente, nem porque talvez amanhã melhore. A gente sempre vai ter algum tipo de problema qualquer que seja; e, se não há, é só porque você não viu.
Mas o não ver é escolha e pronto. Então chega de desculpa. Subordine-se, insubordine-se, invente, volte, vá, fique, tenha preguiça, beba, sei lá. Colecione também sins e nãos. Depois você vê no que deu, mas com desculpa, por favor, não me atente.

terça-feira, setembro 11, 2012

do ciúme


Ninguém deu a ele o direito de gastar com outra moça a música que eu disse que era nossa. Também eu devia ter inventado as coisas direito, passado cola, grudado, ficado. Aí ele não emagrecia e lia e me contava que outra moça chegou sem ser eu.

Ninguém disse que ele podia ser completo sem me ter. O mundo também não parou e ainda gira e eu nem consegui mudar o cabelo.

Talvez ele fique feliz sendo longe. 

Espero mesmo que engorde. E volte. 

quarta-feira, agosto 08, 2012

Que ternura brota e floresce




Queria mesmo ser capaz de abraçar o mundo. Dentro dos braços formar ninho e proteger aquela menina, a outra menina e todo mundo que eu não quero ver chorar. De forma alguma eu com mundo nos braços aboliria lágrima. Governaria as coisas salpicando dor e delícia pra encorpar o tempero do molho.
Queria ela com os olhos vivos e os braços firmes, as pernas firmes, cabeça em riste. Queria o mundo coração de moça, e o meu coração materno, paterno, fraterno, eterno.   

domingo, julho 29, 2012

conversa de pele batida


Quero saber como anda a sua tosse. Você mandou eu não rir e eu disse trinta e três trinta e três trinta e três enquanto tentava chutar o mais alto que podia.
Não boto meu pé atrás da cabeça, mas queria que você daqui gostasse. Quando eu danço, é por cima de você. Que você olha.
Mas você é duro, José.
Tinha pensado te mandar um poema mole mole do Bandeira, que é mais duro que você e talvez te amoleça. Você me bate na cara e manda calar a boca. Eu continuo falando mais ainda, que é pra te irritar.
Você faz uma enquete na praça pra ver se é constante a minha chatice e descobre que ela foi feita no seu molde. Eu descubro que daqui há um tempo você deve emagrecer.
Tenho medos de mudança e você quer que eu voe.
Vou. Mas volto. Veja se cuida longe de mim essa tuberculose. 

sexta-feira, julho 27, 2012

A roda da fortuna e o rei de paus

texto meu publicado no caderno Pensar do jornal A Gazeta

A sala era fumaça pura à meia luz. Um cheiro forte de incenso e cigarro e uns olhos pretíssimos, pintados com kohl. Adalgisa, mesmo vendo muitas cores na cartomante, achava que nos olhos estava o principal. Quis, logo de cara, aquele negrume para si. Sentou-se tímida, afoita, desatada e destrambelhada – desesperada de primeiro amor. Não disse nada além de boa noite e do nome perguntado de cara pela cartomante.

quarta-feira, julho 25, 2012

porque também, além de tudo, a cabeça-dura é quase que genética


E você também não sabe nada de mim. Não tire fora a graça do descobrimento. Você precisa navegar uns mares e eu preciso nadar contra a corrente. Sim, claro, com terra vista em mim, havia meta depois da meta, ou coisa alguma, mas corpo visto.
 É que, ainda seca e quente, a pele é pele. Está comprovado que você tem mãos e um corpo todo, inteiro, grande, denso. Todavia, eu quero coisa respiratória: que você, ou alguém, me invada todos os pulmões.
Vi sim que houve certo caminho narina à dentro e que o cheiro ocupa um mundo todo. Pensei que o querer não era fato. Achei a beleza que incide de uma interrogação, ou de um afastamento.
Saiba ao menos isso de mim: sou puríssimo afrontamento. 

terça-feira, julho 17, 2012

Tubo de ensaio


Fui ficando sem perspectiva. Ele tão bonito que nem parecia meu. Tão meu que nem parecia bonito. Não tentei entender as cores, que são óbvias. Quis mesmo entrar naqueles olhos grandes, enormes.
Encostei a testa e olhei dentro. Encostei a testa e olhei forte. Encostei a mão e disse que seria pra sempre nós dois. Junto. Junto. Junto.
Não concebo sem ele a vida. Quero a vida sóbria. Ele ali me transferindo a dimensão. Escorbuto é quando não tem laranja. Ele é cor de rosa. Não vou passar mal.
A testa dele disse “Não faz assim”.
Cantou. Tão alto, tão forte. Não vá pensando que eu sou seu.
Foi embora. Bonito como se nem existisse. 

terça-feira, julho 03, 2012

Bússola


A coisa está ruim no peito porque o mar estava calmo. E calmo, o mar, atrai os peixes que são homens para o fundo. O mar é um engano.
A vida não vem com bula em que assumidas estão indicações e contraindicações de atos. Não há sapiência justa para dor de amor. Nem mesmo atenuante, há. O inconsolável vem seguindo a maresia.
A ressaca convida para as lambidas das ondas. Vai o homem se dissolver ali pra digerir as dores. Volta o homem dali porque não é possível morrer sem conclusão.

terça-feira, junho 19, 2012

Comecinho de amor


Dorme, por favor. Essa dor nas suas costas só resolve se você estiver dentro aqui de mim. Queria muito que você coubesse e enchesse à ponto de eu precisar vazar. Tenho me esticado pra engolir você.
Já entendi que o cozimento é lento e que não curtes esta onda de canibalismo. Quer lamber primeiro, ver primeiro, cheirar primeiro.
Mas olha aqui: eu não sou vinho. Se for beber, vire como cachaça. 

segunda-feira, junho 11, 2012

fábula do sabãozinho apaixonado


Quando o sabãozinho apaixonado se deu conta de seu estado, esperou a coisa dissolver. Depois de decidido, foi à sabãozinha ainda meio perdido, mas com o amor crescido não se segurou. Ele acreditava em amor sendo estado físico. Disse, então, de sopetão:
- Eu te omo.
E quando disse, ela nada entendeu. Mas é que o sabãozinho queria mesmo tornar-se sabão em pó, e que a sabãozinha também o fosse. Nesse estado, os dois podiam dissolver na mesma água, misturar-se de verdade, fazer espuma. Em pó eles lavariam muita roupa suja juntos e o sabãozinho torcia para que limpassem principalmente lençóis de casais. Queria ele lavar o amor físico dos homens e concluir assim a função de uma paixão que não tem fim. A sabãozinha, já meio gasta, ao entender o fino propósito de tudo, sorriu em barra. Torciam juntos a roupa dos outros e tiravam as manchas do mundo enquanto faziam a mesma prece.

sexta-feira, junho 08, 2012

Tango?

Ele tem cara de abóbora e o outro tem cabelo cinza. Eu queria uma esquina com um, um banco com outro. Mas qual o um que vale a conta?
Aprendi que a alma é grande grande como eu sou pequena. E também que a estatura não vale a curvatura de nada. Mas se ele voltar, que coisa linda!
E o outro, quem é? Se nenhum é número, qual vem em primeiro, não sei. Só queria um volume mais baixo, às vezes, mas outras uma série grande de explosões.
Não vou acordar ninguém de noite, que eu mesma nem sei abrir os braços.
Olhe bem, não sei esse negócio de quadrilha, mas a gente pode brincar ainda de roda.