domingo, outubro 26, 2008
Passado
Os olhos azuis mantinham-se, mas havia uma barba espessa e uma barriga que não faziam parte daquele corpo quando cada detalhe nele me fazia palpitar.
Saí despreocupada e sentei no ponto de ônibus pensando que voltar para casa tinha essas consequências desagradáveis.
Talvez, tendo me visto, ele tenha ficado tão decepcionado quanto eu. Não havia mais cabelos longos e nem a magreza que me fazia única.
Haviam caixos curtos e maquiagem borrada de uma semana seguida de festas. Era ele quem ia pras festas e a cara estava descansada.
Então ele passou novamente e fez questão de me beijar no rosto.
Não tinha mais nada. Nem calafrios nem gotas de suor.
sexta-feira, outubro 24, 2008
Regressiva
Disseram também que as mudanças físicas só se passaram comigo e ninguém mais. Engordar e mudar o cabelo é fundamental a qualquer camaleão medíocre.
Eu não me visto igual todos os dias. Não sei se tenho padrão ou não.
Em um ano eu me sinto muito mais tranquila.
Foi em 2006 que me dei conta de que era sim uma mulher decidida. Ri sozinha muitos dias na praia e vou sempre me lembrar da minha avó perguntar de um cheiro de cigarro que eu não fumei.
Lugares fechados e cheios acabam fedendo pessoas.
Pessoas fechadas e cheias machucam.
Não sei mais me por na bandeja.
sexta-feira, outubro 17, 2008
O dia em que assisti Gota D'água, do Chico.
Deixa pra lá.
Quando eu fui lá e vi o que eu era em palco e o que eu dizia eu já sabia!
A gente almoça e só se coça e se roça e só se vicia.
Eram tão bonitos eles cantando e rebolando enquanto eu chorava e via!
E era tudo tão bonito quando falado.
Todos os motivos estavam nas canções eu sei e eu vi.
É palco e infinito e é peça e é chama.
É a gota e a água e a Bibi e eu.
E todos nós brincando de roda e cantando bonitas canções de ninar.
Deixa em paz meu coração, menino, deixa pra lá.
domingo, outubro 12, 2008
Pós-tpm.
Mas hoje nada.
Estou só cansada de cabeça e com sono de nunca.
Tenho que desativar pra ver se ativam.
Mas nada. Não adianta brigar.
É bom desligar as pilhas.
E hoje nada.
Só Chico.
domingo, outubro 05, 2008
Festa
Vamos todos ouvir clássicos nunca antes ouvidos por nós. E dançaremos colados, sim. Dançaremos valsa e foxtrote - mesmo sem saber- e rodaremos pelos salões clássicos com vestidos longos.
E seremos, todos nós, movie stars. Cantaremos, também. Mas não samba. Cantaremos jazz e depois pop e depois bolero e depois tango. E Funk. Cantaremos funk vestidos em trajes passeio completo. Eu soprano, ele tenor e todo um coro atrás.
Gritaremos tantos funks clássicos com vozes distorcidas e amplificadas pela acústica local!
Ah! Ficaremos todos roucos. Rouquíssimos.
E bailaremos até o dia raiar, sem raiar, sem beber e sem parar.
Já no fim, haverá muitas mentiras pra contar.
quarta-feira, outubro 01, 2008
That
O problema era a rotina que era bonita e bacana com gente bonita e bacana, mas que cansava. Ela queria um dia parar de comer porcarias e parar de reclamar. Voltar pra litreratura e descongelar - mesmo nunca estando gelada.
segunda-feira, setembro 29, 2008
segunda-feira, setembro 22, 2008
Vento
Passa?
Se o texto passa como fica o pé?
Se não tem pé como é que corta?
Pode cortar pé ou dói? Ou dois? Ou dez?
E se não é nada como é que faz?
Se ele não entende como é que fica? Como é que vai?
Tudo bem?
Tanto faz.
Que corte. Que fique. Que corra. Corra. Corra.
terça-feira, setembro 16, 2008
Solução
São os silêncios que ficam ali.
São eles que vazam. E eu fico.
Sempre ficam poemas presos na garganta, formando nódulos, fazendo fumaça, em forma de lágrima, poemas dançando e dor de cabeça.
Sempre forço a narrativa pra fingir que não sou eu. Não sou lírica.
O problema todo é que os poemas são feitos no molde do corpo, feito suor.
O problema é o suor secar e o cheiro que fica.
segunda-feira, setembro 15, 2008
Poema-narrativa-minuto-pós-moderna
Ela seguiu
e se estrepou
segunda-feira, setembro 08, 2008
Trama
Mas a verdade é que os dois se sabiam em cada pedaço de alma e pele. Confidenciavam um ao outro coisas que ninguém jamais poderia saber. E volta e meia se amavam sem contar pra ninguém e sem qualquer paixão. Se viam nus e depois se olhavam corriqueiramente e ninguém diria que havia qualquer ligação.
domingo, agosto 31, 2008
Pírulas
Preciso ler um pouco e dormir muito.
Falta aquela paz que eu nunca quis.
***
Ela tinha uma paixão absurda por orelhas. Não as olhava ou analisava detalhes. Gostava de sentir com a língua e os dentes o potencial erótico do que servia só para ouvir.
***
Não iriam morrer de nada. Eram fortes e muito bem apanhados. Mas quando ela entrou bonita, pequena e de batom vermelho, disparou dois tiros na barriga dele, depois se matou.
***
Que a gratuidade seja infinita enquanto dure, feito amor de carnaval.
sábado, agosto 23, 2008
sem título
Preciso arrumar um chão novo que suporte as minhas loucuras mesmo sabendo que não haverá cumplicidade nem carinho. Preciso estar vazia pra depois encher e transbordar.
Sinto falta do desprendimento que sustenta a minha poesia. Tenho tanto medo de tudo sério. Tanto medo.
Não se estrague e não se mate que eu não me perdoaria. Me deixe ficar quieta e muda tendo inveja das pessoas que não estão tão sozinhas. Me deixe sorrir e fingir que nada importa.
Me deixe. E não fique triste.
quarta-feira, agosto 20, 2008
Carta-crônica para Luiza
Ô Luiza, sua irmã me disse que você disse que não escreve sobre pressão. Disse a ela que você está certa, mas meu processo é diferente. A Viviane Mosé diz que precisa de vazios para escrever. “Faço poemas dos silêncios que ouço”, eu li ela dizer.
Eu não. Eu preciso estar cheia e escrevo pra esvaziar. Preciso de toda a pressão.
Se me pedem, não. Aí é outra coisa. Luiza, eu não escrevo para agradar a ninguém. Até acreditava que sim, mas quando tento a escrita fica tão ruim. Fica tão vazia.
Eu preciso de escrita cheia como preciso de mim cheia para conseguir continuar me locomovendo e fazendo alguma coisa dar certo. Eu preciso que tudo dê certo pra trabalhar e preciso que nada dê certo para escrever. Eu preciso estar cheia e não dormir para me sentir útil.
Talvez eu não seja mesmo normal. Acontece que eu preciso estar full de paixão, feito fool. Aí eu fiquei lembrando da música do que guiava tudo no princípio. Eu cantava que era such a fool for you. E agora canto que it’s time to start changing the rules. E I’m a fool de novo.
Qual é a minha, afinal de contas? Por que é que eu tenho que botar o fool no meio? Por que é que eu tenho que ser a fool, Luiza? Isso de fool não ajuda em nada a escrita. Ao contrário, inibe. Enche de um jeito que é tipo ar. Eu fool me sinto bexiga. Full.
Pois é. A pressão está toda aí, mas a bexiga é forte e não vai estourar. Me passe a sua pressão e escreva, Luiza.
terça-feira, agosto 19, 2008
Pedaços
Agora sou o que quis. Muito estranho pensar que projetei coisas como projeto sempre e agora todas deram certo. Tenho achado que a paixão se dá por culpa de filetes de carne. Tiras. Pedaços moídos e principalmente cheiro.
Eu me apaixono por pedaços. Tons de vozes, olhos, peles, pêlos e nádegas.
Ele tinha carnes fartas e duras, boas de apalpar, e eu gostava de cada filete da carne que eu tinha que sugar e morder.
Ele era forte e grande e eu sumia num abraço.
Ele era do meu tamanho e tinha mãos finas.
Ele era magro e garregava o peso de um dia não ter sido assim.
Ele era bonito.
São os filetes que determinam a intensidade da paixão. Se a gente morde se apega mais que se não morde. Se a gente cheira e fica cheirando é pior ainda.
Filetes de cheiro grudam e fazem falta.
Muitas vezes é melhor não sentir o cheiro pra não correr risco.
Filetes de carne.
Vermelho.
O plano era esse.
domingo, agosto 17, 2008
Liquidificador
O que eu queria saber é por que é que o campo de saber tem que estar delimitado e sê-lo apenas por ele mesmo. Biografias, por exemplo, são história, literatura, jornalismo e até psicanálise. Tudo batido no liquidificador com tanta uniformidade que você não sabe qual é o fator principal.
Estou me sentindo muito melancólica nesse texto. Me falta a doçura ou a ironia de outras crônicas. Nem tenho onde pisar agora. Estou com vontade de engolir o mundo e o meu próprio rabo, feito serpente.
Preciso correr atrás de mim.
O intelectual
“Afetos a gente joga no lixo. Não servem pra nada.” Dizia e depois se apaixonava por várias mulheres que não gostavam dele só pra ele ter certeza que não devia mesmo sair do rumo.
E vivia triste e sozinho.
sábado, agosto 16, 2008
Fossa
Queria se esquecer que só uma pessoa importava.
quinta-feira, agosto 07, 2008
Cotidianidades 001
No alto de seus dois anos de idade ele tinha poderes e cantava "tan tan tan tan" com os bracinhos esticados para frente. Virou pra mim e disse “você é a mulher gata”. Acreditei. Ele ficou voando de um lado para o outro e eu caí na besteira de perguntar:
- Você é o Super Homem?
- Não! Sou o Batmaaaaan!!
terça-feira, agosto 05, 2008
Da nada
Não tenho nenhuma história para contar, as minhas se esgotaram todas e ando vivendo uma rotina sadia, quieta e com picos constantes de raiva que mantem-me viva. `Preocupo-me, então, com a rotina alheia que por vezes parece muitíssimo interessante. Aí cansa. Cansa por que a história do outro a gente não vive, só ri. Nalgumas vezes a gente tem ciúmes de tanta emoção e suspiros que nós, meros mortais, não temos na rotina calma que se faz entre corridas de empregos, projetos, estudos, amores e colos.
Só que eu tenho que me forçar a escrever pra ser escritora de verdade. Esses dias alguém me falou de certa rotina. Acho tudo muito forçado. Acho que texto tem que vir da alma e com suor. Ou com vontade. A vontade é fator fundamental em qualquer texto escrito por qualquer pessoa.
Ultimamente, não tenho tido muita criatividade com palavras. Tenho mexido com cozinha.
Pra fazer angu você frita o alho, joga fubá, água e sal. De preferência, só isso, mas eu sei que você acaba pegando aquele tempeiro pronto que tem na geladeira e joga em tudo. Fica bom também. Mas o Angu sozinho não tem tanta graça.
Precisa ter carne moída em cima. E você deve fritá-la com cebola bem picada, jogar tempeiro pronto, sal, salsa, ervas finas e todas as coisas temperísticas que achar na geladeira. Depois de bem frita, joga água e deixa cozinhar. A cebola, nisso, derrete. Aí a água seca e você frita mais, depois cozinha mais.
Aí depois joga pomarola.
Por fim, uma camada de angu, uma camada de queijo e outra de angu e outra de queijo. E aí vem a carne moída.
Pronto, almoço.
Pronto, fiz crônica.