segunda-feira, dezembro 15, 2008

Talk to the hand

À Flora




A conversa é pesadíssima. O termo, inclusive, lembra várias coisas a serem resolvidas e que não querem ser resolvidas.
Tomava guaraná como quem toma conhaque e no som, ouvia Ella Fitzgerald. Lembrava bastante do violão de mais cedo e o quarto tinha um estranho cheiro de fumaça.
Pensava muito na pesadice das coisas. Na pesadice de tudo, inclusive do que não é dito e fica só no peito. Pensava muito em peitos e cheiros estranhos de fluidos de corpos.
Queria parar de tentar levar o mundo nas costas e então pensava em outras costas, queixos e principalmente pés.
Não gostava de pés, achava-os muito feios. Mesmo os seus eram horrorosos e tinham muito peso e calos e bolhas. Na cabeça, muitas moças e rapazes que lembravam diversos problemas distintos. A conversa devia vir depois de Ella e depois do sábado.
Sábados sempre foram gravíssimos por culpa das sextas-feiras.
Sua pele de sábado mesmo tinha uma plasticidade estranha e uma textura meio graxosa.
Pensava mais do que queria e tentava se distrair arrumando os próprios cabelos em tranças. Ficava com cara de outra pessoa quando fazia tranças infantis e pensava em ganhar presentes de natal.
Mais um gole de guaraná e presentes.
Tomaria gim no dia seguinte.
A conversa ela não sabia. Pesada demais pra quem ouve Ella cantando Jobim.

5 comentários:

Flora disse...

pode dedicar o texto para Flora,mas ele é muito mais aline do que flora.

blog disse...

Ella, Ella.
Nem vc, Aline, é melhor que Ella. Nada supera.
E olhe que vc é das boas, com ou sem texto, mas, nele, vc rasga bem o verbo.
Essa melancolia que vc faz brotar no texto me deixa satisfeito. Não é fuga nem desbaratamento, correr pela campina, abrir o gás, essas coisas. É ficar e encarar.

Por isso curto essas visitas matinais. De férias, posso comer bolachas quase na hora do almoço. E ler. E gostar.
Bjo, querida.

Darshany L. disse...

gim é bom?

Anônimo disse...

Algumas passagens desse "Talk..." soam como poema em prosa.
Fiquei impressionado.

Ass. Anôn.

Anônimo disse...

MATÉRIA ESCURA


“Não existe rock com dor”
(Cazuza talvez).

No blues,
bastante ao revés,
alguma coisa
quase sempre
sangrou.

Existem rock,
blues
e, graças a Deus
ou
ao Grande Bode,
blogs
em “Gotas” de gatas
e “Br
eu”.

(E o anônimo
se releu
só meio animado.
Não assinou.
Apenas
subscreveu
o que entendeu poder –
e conformado
pensou:
adeus
ao trilho que não corre brilhando
ao lado.)