quinta-feira, novembro 06, 2008

Ritual

Quando ele cruzou a sala de estar larguei imediatamente a xícara de chá. Tinha que me levantar e analizar cada pequeno pedaço de corpo.
E ele tinha justamente que passar por mim pra arrancar com os olhos cada pedaço de corpo que eu tinha. Não tenho mais.
Pusemo-nos frente a frente e vimo-nos arrancando os braços um do outro. Comi-o cru.

Comecei pelos dedos das mãos e passei imediatamente para as coxas. E ele fez o mesmo comigo até sobrarem as cabeças vibrantes e sem ar. Morremos atolados de paixão.

Aí eu sacudi a cabeça e fiz uma mesura. Vesti meu sorriso mais bonito e deixei que ele fosse.

Não ia demorar a voltar. Sorri por dentro. Voltei ao chá e o cuspi num reflexo. Estava frio.

6 comentários:

Nat Valarini disse...

Boa tarde!

Menina que texto bom!

Estáde tirar o fôlego!

Tem um quê de sensualidade, mistério... tudo muito suave mas ao mesmo tempo intenso, sabe?

E este chá frio? Sinal que o tempo de amor foi longo e precioso, nem viu o tempo passar...

Muito bom!

Anônimo disse...

"E ele fez o mesmo comigo até sobrarem as cabeças vibrantes e sem ar."

Meu deos são tantas palavras que me perco nos sentidos.

;)

Erich Pontoldio disse...

Que intensidade heim?

sacodefilo disse...

Chegou, abalou, preencheu e se foi. Muito legal... se nada deixar a não ser saudades e uma xícara de chá.

Lembrou, na música Terezinha de Chico Buarque, o terceiro que chegou:

"O terceiro me chegou
Como quem chega do nada
Ele não me trouxe nada
Também nada perguntou
Mal sei como ele se chama
Mas entendo o que ele quer
Se deitou na minha cama
E me chama de mulher
Foi chegando sorrateiro
E antes que eu dissesse não
Se instalou feito um posseiro
Dentro do meu coração"


altamente intertextual.
Muito bom.. viajei.

Anônimo disse...

Muito intenso! Ótimo texto!

Anônimo disse...

Sua gulosa...

Seu texto está brilhante, Aline. Muito intenso.