terça-feira, outubro 02, 2007

Cinema

Os dois se encontraram na cantina ao lado do cinema. O cinema tinha uma sala só e era famoso por passar filmes alternativos. Fernanda estava esperando seu filme começar quando cruzou com Rodrigo. Ele tinha cara de quem sabia demais e ela era extremamente curiosa. Ela queria saber o que Rodrigo tinha a esconder. Ela saberia mais cedo ou mais tarde. Os dois sentaram-se na mesma mesa.
Ele tinha cabelos castanhos e a pele morena de sol. Ela tinha cabelos claros e longos, não era bonita, era mediana. Tinha cara de mulher comum e não tinha muito o que falar e o que esconder.
Os dois ali, na mesma mesa, travavam uma luta para ver quem escondia mais e quem mostrava mais. Nenhum queria ou podia perder. Os dois estavam errados em começar aquela briga. Fernanda não foi ao cinema.
Rodrigo disse que podia fazer muitas coisas e que tinha muita coisa a dizer, mas não disse nada e não fez nada. Fernanda esperou. Na verdade, ela tinha um medo grande e uma vontade grande de saber.
Antes daquele dia os dois nunca tinham conversado.
Nenhum sabia quem era o outro.
“por que você o está defendendo?”
“Eu não estou defendendo ninguém.”


E por que usar aspas em vez de travessão? A Aline que escreve esse texto nunca gostou de aspas. Ela sempre usou travessão por que aprendeu na primeira série que era assim que se escrevia diálogos. Mas ninguém nunca disse à Aline que se deixa claro num diálogo quem é o sujeito que fala. A Aline desaprendeu a escrever, ou talvez nunca tenha aprendido a fazê-lo.


E Fernanda não sabia bem como se posicionar. Não tinha nada a perder e se perdia no tempo por pura curiosidade. Talvez não valesse à pena insistir. Rodrigo não devia valer nenhum verso. O filme ela já tinha perdido.
Ele parecia por à prova o tempo inteiro tudo que ela tinha a dizer. Ele punha a prova quem ela era. Descreditava.
Ela ainda queria saber de tudo e não queria tomar banho ou ir embora. Os outros deviam esperá-la. Havia vida além dali.
Fernanda tinha gastado o dinheiro do filme e não o teria de volta.
Rodrigo não falava nada que prestasse, apenas acusava.
Ela tinha nojo dele e de tudo que ele falava.
Ele percebia que na verdade, era ele quem estava sendo descreditado.
Era hora de ataque.


E a Aline que escreve esse texto sente necessidade de cortar a história no meio por medo do fim.


Rodrigo conhecia a vida de Fernanda e tinha que jogar isso na cara dela. Ele não sabia o quanto ela detestava que o fizesse. Talvez soubesse. Talvez ele fosse dissimulado a ponto de saber controlar toda aquela situação.
O que ele sabia?
Ela não era prática. Já tinha percebido que não tinha o que fazer e não ia embora dali.
Devia sair.
Rodrigo tinha o que esconder, então jogava com o passado dela. Escancarava pra ela o que ele sabia.
E ele não sabia nada demais.
Ela fez questão de frisar que era mentira.
Se perdeu.
É claro que ele sabia que aquilo a atingia e ele jogaria pra ser ouvido, mesmo não tendo o que dizer.
E ela se viu desesperada e sem razão nenhuma.
Tinha que ir embora.
Foi embora.
Uma pena ter perdido a sessão de cinema.

Um comentário:

Anônimo disse...

É tudo tão familiar, que nós tras sensação de estar em casa.
Tem vida... É vida!


Beijos!